sexta-feira, 24 de maio de 2013

Aula do dia 21/05/13 sobre “morte”





Nosso modo de enfrentar a vida depende muito do modo como encaramos a morte, e vice-versa!
Quatro modos possíveis de encará-la, de colocar-se diante da realidade da morte.
Há aqueles que a ignoram.
Há ainda aqueles que diante da morte se angustiam,
Há também o grupo dos otimistas ingênuos. (desencarnação) Há ainda um modo tipicamente cristão.
A morte existe sim! E dói! E machuca! Não somente existe, como também marca toda a nossa existência: vivemos feridos por ela, em cada dor, em cada doença, em cada derrota, em cada medo, em cada tristeza... até a morte final!           


Mas, o que significa morrer?
A morte, primeiramente, revela nossa finitude, nossa limitação!: eu não digo, “Meu corpo morre”, ao invés, digo e sinto: “Eu morro!”
Desde o Batismo, estamos unidos a Ele; vamos morrendo com Ele nesta vida para, enfim, ressuscitar também com Ele. Assim, aquele que é batizado já não vê na morte o angustioso fim do seu ser, mas a possibilidade última e mais radical de configuração com seu Modelo, que é Cristo ressuscitado.
”Com ele fomos sepultados pelo batismo na morte para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, assim também andemos em novidade de vida. Pois, se estamos inseridos no solidarismo de sua morte, também o seremos no da ressurreição” (Rm 6,4s).
Morrer, para o cristão, já não deveria ser uma fatalidade: ele deveria dizer: “Morro a cada dia, em cada lágrima, em cada tristeza, em cada derrota... Mas não morro como um derrotado: uno minhas mortes à morte do Senhor, para como ele ressuscitar!” A morte, assim, vai ganhando sentido em nós, vai se tornando uma realidade humana e cristã, e não uma fatalidade biológica.
Para nós Jesus que vem ao nosso encontro (cf. Mt 11,2): “Vou e retorno a vós” (Jo 14,18.28). Ele vem vindo sempre na nossa existência: Batismo, na Eucaristia e finalmente, ele virá na passagem definitiva, no momento do encontro final. Por isso mesmo Paulo exclamava: “O meu desejo é partir para estar com Cristo” (Fl 1,23). Santa Teresinha dizia com sabedoria: “Não é a morte que virá me buscar, é o bom Deus!”
Pois bem: eis a conclusão maravilhosa: não morreremos sozinhos; morreremos como Cristo e com Cristo; mais ainda: morreremos em Cristo.

Para a Sagrada Escritura, o homem é um todo, corpo e alma espiritual ou em outra linguagem, corpo, alma e espírito. Nós temos a dimensão material (nosso corpo) e aquela dimensão imaterial (a que denominamos alma). São dimensões, não pedaços nossos! Eu sou um todo: sou meu corpo e sou minha alma! É absolutamente contrário à Sagrada Escritura e a uma sã antropologia pensar o ser humano simplesmente como um espírito que “tem” um corpo, que está encarnado num corpo! Nada disso: sou corpo e alma!
A Parusia do Senhor e o Juízo Final 
 A Parusia do Senhor será manifestação plena da sua Glória, do seu esplendor, da sua luz e, por isso mesmo, iluminará todas as coisas: a história humana e nossa história pessoal
Em Mt 25 Jesus conta várias parábolas que mostram sua chegada como momento de julgamento: as dez virgens, que deverão ser examinadas pelo Noivo que chega, o homem, que viajando, na volta pede conta dos talentos aos empregados e o último julgamento, quando o Filho vier em glória e separar bons e maus, chamando a si os bons e apartando de si os maus. Repito: a ambigüidade da história desaparecerá à manifestação de sua luz - ele, que é o seu sentido último. Por isso mesmo, somente a Deus e a seu Cristo compete o julgamento (cf. Mt 13,24-30: a parábola do trigo e do joio), ler (1Cor 4,3-5)
O juízo acontece a cada dia, na nossa atitude de acolhimento ou rejeição de Deus em Jesus Cristo presente no irmão (cf. Jo 3,18; 3,36; 5,24; Mt 25,31s),
O Pai deu ao Filho ressuscitado todo o poder de julgar: “O Pai não julga ninguém mas entregou ao Filho todo o poder de julgar” (Jo 5,22). 
 O juízo tem, portanto, uma dimensão trinitária: o Pai entregou ao Filho o julgamento, que se dará na luz e na potência do Espírito! Em Cristo glorificado pelo Pai e pleno do Espírito, tudo será julgado!
           Este juízo é salvífico: Deus não vem para condenar, mas para salvar... agora quem se fechou para o Senhor, claro que ficará fora da salvação de Deus (cf. Sb 3,10 e também o capítulo 5). (Dn 12,2s).
            Para o Novo Testamento, como já foi dito acima, é nossa atitude em relação a Cristo nesta vida que definirá nosso destino: ele é o critério do juízo (cf. Lc 12,8ss; 9,26; 11,30; Mc 3,38; Mt 16,27).
            A respeito do julgamento, alguns autores atuais falam em auto-juízo: na luz do Cristo nós mesmos nos julgamos. Tal expressão é ambígua: é correta se pensamos que, à luz de Cristo, nos veremos como somos e veremos nossa própria verdade; por outro lado, é errada se pensarmos que nós mesmo seremos nossos juízes!
Juízo final x juízo particular

A purificação após a morte: o estado purgatório
O purgatório é uma invenção  da Igreja católica?
 Não existe, na Bíblia, uma passagem falando sobre o purgatório, nem tampouco existe esta palavra “purgatório”!
*      No Antigo Testamento aparece uma constante convicção que somente uma absoluta pureza é digna de ser admitida à visão de Deus; nada de impuro pode estar diante dele (Ex 19,10s; 20,18s). “Ai de mim! Estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de lábios impuros, e meus olhos viram o rei, o Senhor Todo-poderoso” (Is 6,5). “Lá haverá um caminho; chamar-se-à Caminho Santo. Nenhum impuro passará por ele; os insensatos não errarão nele” (Is 35,8). Também o Novo Testamento tem esta mesma convicção: Jesus afirma que os puros de coração verão a Deus (cf. Mt 5,8) e o Apocalipse diz que nada profano entrará na nova Jerusalém (cf. 21,27). 
*       Deus não salva o homem automaticamente, sem a sua aceitação e sem a sua participação. Nós somos aquilo que fomos fazendo na vida; nossos atos nos formam, formam nossa personalidade e terão consequências no nosso destino eterno! 
           Imaginem uma pessoa que ama o Cristo, que vive nele, que tem uma vida de Igreja... mas esta pessoa tem um vício, uma falha, uma má tendência que não consegue superar. Ora, após a morte, certamente esta pessoa vai ter que ser purificada desta má tendência que estava “colada” nela: é como a ferrugem que precisa ser raspada! É à luz dessa situação que a Escritura apresenta e aprova o costume da oração pelos defuntos. Leia, por exemplo, 2Mc 12,40ss. Vejamos também outros textos: “De outra maneira, o que pretendem aqueles que se batizam em favor dos mortos? Se os mortos realmente não ressuscitam, por que se batizam por eles?” (1Cor 15,29). O Apóstolo, aqui, refere-se a uma rito existente na Igreja de Corinto de ‘fazer-se batizar pelos mortos”. Parece que os fiéis esperavam que um batismo no lugar dos mortos favoreceria os membros pagãos de suas famílias que já haviam falecido. Ou então, o batismo no lugar dos catecúmenos falecidos antes do batismo. Paulo nem aprova nem desaprova tal prática... O que nos interessa aqui é a convicção que Paulo mostra de que certas ações litúrgicas, certas orações da Igreja, poderiam ser proveitosas aos mortos! Isso aparece claro! “O Senhor conceda sua misericórdia à família de Onesíforo, porque muitas vezes me socorreu e não se envergonhou de minhas algemas. Pelo contrário, quando veio a Roma, procurou-me com solicitude até me encontrar. O Senhor lhe conceda a graça de obter misericórdia junto ao Senhor naquele Dia. Sabes melhor do que ninguém, quantos bons serviços prestou ele em Éfeso (2Tm 1,16-18). Segundo os indícios, Onesíforo está morto e Paulo intercede por ele, suplicando a misericórdia do Senhor. Em outras palavras, Paulo reza por um morto!
            Concluindo, está presente na Escritura a oração pelos mortos, que a Igreja conheceu e praticou constantemente. Também a Tradição mais antiga da Igreja atesta abundantemente o costume de rezar pelos mortos litúrgica e privadamente. Tais testemunhos encontram-se particularmente nas catacumbas e cemitérios. Pense-se, por exemplo, na famosa inscrição encontrada sobre o túmulo de um cristão chamado Abércio, no início do cristianismo. Aí lê-se: “... quem compreende e está de acordo com estas coisas, rogue por Abércio”.Tertuliano, no século III, atesta largamente o costume de orar pelos defuntos pública e privadamente, inclusive oferecendo por eles a Eucaristia. Ele diz claramente que a viúva “ora pela alma (do marido)... e oferece um sacrifício em cada aniversário de sua morte”. Assim, é claríssimo o costume da oração pelos mortos nos quatro primeiros séculos cristãos. Um texto que teve particular importância para o nosso tema foi o de São Cipriano, bispo de Cartago no século III. Explicando uma frase de Cristo, ele diz o seguinte: “Uma coisa é não sair o encarcerado até pagar o último centavo e outra é receber sem demora o prêmio da fé e do valor. Uma coisa é purificar-se dos pecados pelo tormento de grandes dores e purgar muito tempo pelo fogo... e outra, ser coroado logo pelo Senhor”. Cipriano aqui refere-se aos que fugiram do martírio nas perseguições: para aqueles que não puderam se purificar antes da morte ou pelo martírio, haverá um “fogo purificador”, fogo purgatório. Aqui aparece pela primeira vez um testemunho explícito da convicção deste estado purgatório. Mas, notemos que a expressão “fogo purgatório” é, metafórica.
            Desde então, vai aparecendo cada vez mais claro para os cristãos: 
(1) a existência de um estado no qual os defuntos são purificados,
(2) o caráter penal-expiatório deste estado e
(3) a ajuda que os sufrágios, as orações dos vivos podem dar aos defuntos. 
            Afinal, como devemos entender o purgatório? Vamos partir de uma belíssima imagem do Apocalipse, que descreve o Cristo ressuscitado: “Os olhos eram como chamas de fogo. Os pés, semelhantes ao bronze incandescente no forno, e a voz, como a voz de muitas águas” (Ap 1,14b-15 cf. Dn 10,6).
            Morrer é partir para estar com Cristo, para encontrar aquele que “tem os olhos de fogo”, quer dizer, que nos vê como somos. No nosso encontro com ele, este fogo do seu olhar amoroso, fogo que é o próprio Espírito Santo, nos purificará: tudo aquilo que em nós foi “poeira do caminho”, aquelas pequenas coisas que ainda nos atrapalhavam e impediam que fôssemos totalmente livres, serão “queimadas”, purificadas no abraço final que Cristo nos dará! Então, compreendamos bem: o purgatório não é um lugar, nem está entre o céu e o inferno! O purgatório é a purificação que recebemos logo após a nossa morte, quando o abraço amoroso de Cristo nos envolve no fogo do seu amor! A gente passa pelo purgatório logo após a morte, caso ainda tenhamos aqueles apegozinhos, aquelas escravidõezinhas, aqueles pecadinhos de estimação.... Cristo completará em nós a obra começada. Mas, atenção: não é que a gente vai se converter depois da morte! Nada disso! Com a morte acaba nossa possibilidade de escolha: o purgatório é para quem escolheu o Cristo, viveu com ele, mas ainda tinha as pequenas incoerências de cada dia! Quem escolheu viver longe de Cristo não experimenta o purgatório, mas, ao contrário, viverá para sempre na contradição. Vimos isso quando falamos sobre o inferno!
            E as famosas penas do purgatório? Tratam-se simplesmente da dor, do sofrimento por ver que não amamos o bastante o Senhor. Quem é amado e descobre que não correspondeu a este amor como devia, sofre! Assim, o sofrimento do purgatório não é algo que Deus nos impõe, mas algo que vem da nossa própria imperfeição, da dor de não ter amado o bastante.
            E para que rezar pelos mortos que passam por este estágio purgatório? Já vimos que a Bíblia atesta a oração pelos mortos: trata-se de uma expressão belíssima da solidariedade dos membros do Corpo de Cristo: os mortos não cumprem seu destino de modo solitário, mas inseridos no Corpo do Senhor. A Igreja da terra está unida à Igreja que se purifica: o amor de Cristo nos uniu! Inseridos no Corpo de Cristo pelo Batismo, jamais estamos isolados, jamais estamos sozinhos! Mais ainda: neles, a Igreja mesma se purifica para ser Igreja glorificada!
            Uma última questão: se o purgatório acontece imediatamente após a morte e ninguém “fica” no purgatório, mas “passa” logo e pronto, para quê, então, rezar pelos mortos? É que para Deus não há tempo; tudo para ele é presente: a oração que fazemos hoje serve para um irmão nosso que já morreu há cem anos!
            Assim, rezemos pelos nossos mortos. Às vezes a gente escuta dizer na missa: “pelas almas do purgatório...” O que significa isso? Simplesmente: “pelos nossos irmãos que se purificam...” Rezamos para que sintam nossa solidariedade, já que a Igreja é a comunhão dos santos (=dos batizados), todos unidos no Corpo de Cristo ressuscitado.
            É muito errado fantasiar o purgatório, pensando que é um lugar, ou que lá se está sofrendo castigos, ou que alguém fique lá por uns tempos... Na outra vida não há tempo como aqui, nesta vida! Cuidado com as afirmações tolas e infantis!
            Uma coisa é certa: somente purificados de nossas incoerências poderemos estar com Aquele que é a Verdade. Se não arrancarmos nossos pecadinhos de estimação aqui, o Senhor vai arrancá-los no momento de nosso encontro com ele! E que dor saber que não fomos generosos o bastante! É isto - e só isto - que a Igreja quer dizer quando fala em purgatório!
            Com isto terminamos nossos tópicos de escatologia. Espero que tenham servido para esclarecer melhor nossa esperança em Cristo e nossa fé católica! Obrigado a você que me acompanhou ao longo destes artigos neste site.

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